domingo, 27 de fevereiro de 2011

Além da Realidade - um animatrix


Que Matrix, dos irmãos Wachowski, é um dos melhores filmes de ficção científica da história, todo cinéfilo sabe. Não apenas por seus efeitos especiais mas principalmente pelo enredo que aborda questões ligadas à realidade virtual, filosofia e política (por que não?). Matrix está ao lado das grandes e memoráveis ficções científicas que fazem pensar - não é apenas entretenimento. Junto a Blade Runner- O Caçador de Andróides, de Ridley Scott e 2001- Uma Odísséia no Espaço, de Stanley Kubrick, Matrix já faz parte da antologia das ficções científico-filosófico-existenciais. Inesquecível!

Entretanto, Animatrix, creio que poucos conhecem, provavelmente só os fãs de Matrix. Trata-se de um conjunto de 9 contos/animações, alguns escritos por Andy e Larry Wachowski, que combinam computação gráfica com o anime japonês. Os contos falam sobre os acontecimentos relacionados a Matrix, a guerra contra as máquinas e a posterior subjugação da espécie humana.

Dentre os meus prediletos, um especialmente me encanta pela magia e delicadeza. Chama-se Beyond, (no Brasil, Além da Realidade).O curta é a história de uma falha no sistema operacional da Matrix: um terreno abandonado com uma mansão de aspecto mal-assombrado, onde o inusitado e o impossível, para as leis da física, acontecem para alegria de algumas crianças em busca de aventura em meio a rotina de uma cidade e humanidade mecanizadas. Mas como toda falha em um sistema deve ser corrigida... Bem, não direi mais nada sobre a história, melhor é assisti-la.

Só queria acrescentar que este conto me faz pensar o quanto é lamentável quando a magia e o encanto são considerados supérfluos, se não perigosos; como um regime totalitário (no conto, representado pelo sistema operacional da Matrix) sempre se sente tão ameaçado diante de situações que fogem ao seu controle; e que o excesso de assepsia, em tudo, se assemelha às ideologias fascistas e de extrema direita. Ao assistir a animação vocês irão entender porque estou dizendo isso - ou não: afinal, cada um faz sua própria leitura.

Infelizmente, no youtube, só encontrei a versão sem legenda, mas encontrei outra, legendada, aqui: Comunidade Geek: Além da realidade

Ah, a animação tem roteiro e direção de Kôji Morimoto. Não deixem de assistir! Só vão precisar de um pouco de paciência porque às vezes o vídeo demora pra carregar, normal...

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Um Olhar Diverso

Dizem que Ana sempre olhou muito mal.
Que ela simplesmente não via o que quase todo mundo via.
Que seu olhar dispersa das coisas.
E que, entre outras coisas, só via de suspiros pela lua cheia nascendo no horizonte, ou via de chateação pela espinha impertinente nascendo em seu rosto.
Ana sempre enxergou melhor com os ouvidos.
Até parece que nasceu de música.
Poderia ser cantora, violonista, pianista.
Mas não, Ana escolheu as artes plásticas que pedem tanto aos olhos.
Assim Ana habituou esfregar seu olhar nas coisas ao seu redor.
No entanto esse olhar atento durou pouco tempo.
Ana distraída começou a ver com a imaginação, mais ou menos como fazia quando criança e via o que ninguém via.
Ana desenhou delírios e criou seres nunca vistos.
Nem tardou e Ana abandonou as artes.
Decidira escrever poesia e seu olhar se voltou para dentro.
Escreveu de sentimentos e sensações, principalmente sensações: "o sentimento vaza como música em minha pele".
Ana descobrira que não só os versos mas cada palavra, em si mesma, comporta sensações.
Carrasco, por exemplo, é uma palavra bem seca provavelmente pelo dígrafo rr seguido de asco.
Burburinho é uma palavra que borbulha e faz cócegas ao pé-do-ouvido.
Enquanto jequitinhonha tem algo de nhoc-nhoc, nhac-nhac.
E alpendre tem uma amplitude inicial mas aconchega no final.
Ana prestava muita atenção às sonoridades das palavras e suas significâncias, daí inventava neologismos.
Alguns dizem que Ana virou poeta porque enxergava muito mal com os olhos (bendita deficiência!).
Ana é de ouvidos, de sensações, imaginânsias e sonholências.


Maio de 2010 (texto reeditado)

sábado, 19 de fevereiro de 2011

uma melancolia dessa é sempre bem-vinda!



Salve, Thom Yorke, salve!

O Radiohead é uma banda que sempre me emociona, não vou nem dizer porquê: não encontro palavras que alcancem esse sentimento...


Ah, sei que pode ser bobagem dizer isso, mas o Thom Yorke nasceu em 1968, que nem eu.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

ativismo anti-racismo com sabor de pista de dança!



Lembro quando eles tocaram aqui, em Recife, no Abril pro Rock de 2001. Dancei um bocado esse som que mistura raggamuffin, drum'n'bass, rap, cítaras e tablas. Emocionante!

Asian Dub Foundation - site oficial: aqui

citação

"Enquanto o homem permaneceu cativo de seus instintos, batalhando apenas para atender às necessidades, não passou de um animal. Somente quando foi capaz de morrer por uma coisa inútil, quando entregou toda sua energia e arriscou a vida para desenvolver a capacidade criadora é que se tornou efetivamente um ser humano. A arte foi a descoberta apaixonada daquilo que não é essencial à subsistência".

Fábio Lucas (in Sinistras Bibliotecas)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Superfly - trilha sonora


Um dos melhores álbuns dos chamados blaxploitations - filmes norte-americanos da década de 70 feitos para o público negro, com temática relacionada à realidade (um tanto estereotipada) dos negros. Superfly (1972) é considerado o disco mais importante de Curtis Mayfield, músico de soul e funk estadunidense, falecido em 1999.

Eu amo esse disco, é até difícil escolher uma faixa - todas são deliciosas - mas escolhi pra tocar aqui Freddie's Dead, até porque no youtube não tem muitas disponíveis.


Só um comentário: tem uma cena em  Pulp Fiction de Quentin Tarantino (diretor muito influenciado pelo blaxploitation) que sempre lembro quando ouço Freddie's Dead. É a cena em que o personagem de Bruce Willis, montando em sua motocicleta, diz pra namorada: "Zed is dead, baby, Zed is dead...". Será que Quentin Tarantino tinha em mente essa música? Ou quiçá o próprio filme, Superfly? Ou sou eu que "viajo" demais?

Eis Freddie's Dead, babies, Freddie's Dead...

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Banksy - arte de rua e crítica social

Muitos são os teóricos, acadêmicos, sociólogos, arquitetos e urbanistas que fazem a crítica do espaço urbano e sua ocupação. Mas também existem aqueles sem formação acadêmica que têm muito a dizer, não através de ensaios, teses de mestrado e doutorado. Falo dos artistas de rua que utilizam o próprio espaço da cidade como seu local de contestação - seja do uso que se faz do espaço urbano ou da sociedade em geral. Através do grafite, pichação, estêncil, adesivos, lambe-lambe e outros meios de intervenção, eles apresentam sua mensagem e crítica social.

Recentemente conheci, através do blog Barro do Sonho, o artista de rua britânico Banksy. Fui ao seu site oficial e pesquei as pérolas abaixo (para ver as imagens em tamanho maior, dê um clique nas mesmas).


No site do Banksy tem muito mais!

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Descanse em paz, dependência do Ocidente


por: César S. (in aNImOt)


Eis uma listinha curta, levando em conta só alguns fatos bem recentes:


  • A cara da África tá mudando. Pontes e outras obras de infraestrutura pipocam por todos os lados. A razão é a grana chinesa, 9 bilhões de dólares nos últimos seis anos. 
    • Moral da história: a África não depende do Ocidente pra se desenvolver. 
  • No Fórum Social Mundial, Lula dá a real: o Ocidente tá cagando e andando para a fome e a miséria pelo mundo afora, só tem olhos pro próprio umbigo. 
    • Moral da história: se queremos justiça e desenvolvimento, temos que contar só com nós mesmos. 
  • Cuba ganha cabos de fibra ótica, com a ajuda da Venezuela, China, Jamaica (e também França, é verdade).
      • Moral da história: O Caribe vai se desenvolvendo, apesar do esforço estadunidense em contrário. 
    • O melhor de todos os fatos: o povo egípcio, incluindo mulheres, sai às ruas para exigir a realização nacional de uma organização social tipicamente atribuída aos povos ocidentais, a democracia -- mas os ocidentais vacilam em apoiar, acham que não é uma boa ideia
      • Moral da história: não é preciso ter apoio de ocidentais para defender aqueles que são considerados seus valores intrínsecos. 
    • A coisa da dispensabilidade do Ocidente vale até para o mal: ante a remotíssima possibilidade dos EUA tirarem o 1,5 bilhão de dólares de "ajuda militar" ao Egito, o rei (ditador?) da Arábia liga o foda-se, e diz que se os EUA tirarem a grana, ele a dará para Mubarak em seu lugar
      • Moral da história: o exército do Egito não depende do Ocidente pra ter sua bolsa-ditadura. 
    Dá para continuar listando fatos como esses por bastante tempo. Todos têm a mesma moral: seja qual for a meta, boa ou má, o mundo vai dando um jeito de seguir seu caminho independentemente do apoio do tal do Ocidente. 

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Stela Campos

A década de 90 foi um período de grande efervecência cultural, principalmente musical, em Recife. Foi a década do surgimento do manguebit - prefiro essa grafia (assim como Fred 04) a manguebeat pois o movimento não se baseava num ritmo ou batida (beat) e sim na informação (daí "bit": menor unidade de informação digital) aliada à diversidade cultural recifense, ali representada pelo mangue ou, como dizia Chico Science: a imagem de "uma parabólica enfiada na lama".

Naquela década, pela primeira vez, os olhares dos formadores de opinião se voltaram para Recife, reconhecendo-o como um importante centro de música pop/rock e da boa! Foi quando Chico Science & Nação Zumbi e Mundo Livre S/A gravaram seus primeiros discos. Quando um festival de música produzido no Nordeste (Abril pro Rock) se tornou referência nacional e internacional, estimulando a formação e amadurecimento de várias bandas de estilos diversos. E foi em meio àquela agitação, que chegou em Recife uma moça, uma jornalista paulistana, também cantora e compositora que veio passar três semanas na cidade mas acabou permanecendo por seis anos na Manguetown. Citei seu nome há duas postagens atrás. É a tal moça que juntara-se aos Fellinis no projeto Funziona Senza Vapore e apresentou a música Criança de Domingo a Chico Science. Seu nome é Stela Campos.

Enquanto morou em Recife, Stela conheceu um bocado de gente boa como Chico e Fred 04. Fez shows. Participou de coletâneas, uma em tributo a Luiz Gonzaga e outra a Reginaldo Rossi. Participou de trilhas sonoras de filmes pernambucanos como Baile Perfumado. E até gravou seu primeiro disco solo, Céu de Brigadeiro (1999). Enfim, Stela se envolveu totalmente com a cena do Recife, o que só lhe acrescentou em termos criativos ainda que sua música não contenha sons regionais.

Quando aterrissou em Recife Stela já tinha uma banda, Lara Hanouska, e remontou-a com músicos locais. Mas depois de um tempo resolveu partir para carreira solo.  Em 2000 Stela retornou a São Paulo após receber uma proposta de emprego. Mas ainda que trabalhando como jornalista (afinal precisava pagar suas contas) continuou circulando pelo underground paulistano. Em Sampa já gravou mais três discos, Fim de Semana (2002), Hotel Continental (2005) e o mais recente, Mustang Bar (2009), considerado seu trabalho mais visceral, com ênfase nas guitarras.

As músicas de Stela são pequenas crônicas urbanas que falam da correria cotidiana, de tédio, solidão, melancolia. Ou seja, fala de coisas comuns, sobre pessoas comuns vivendo em grandes centros urbanos. Luciano Buarque, pernambucano que conheceu na noite recifense, é seu parceiro nas músicas e letras (mais nas letras). E também é seu parceiro de palco e na vida conjugal.

Quanto ao estilo, bem, Stela transita por vários. Chico a chamava de "Billie Holiday de garagem" e muitos a chamam de "Lou Reed  de São Paulo". Tem influência de folk, jazz, rock de garagem, noise, música eletrônica, pós-punk... Sempre acompanhada de músicos excelentes e uma produção musical apurada. Em Mustang Bar o som está bem sessentista, psicodélico, com um pouco de pop francês. Ao ouvir o disco dá pra perceber bem a influência de Lou Reed e do Velvet Underground em várias músicas.

Bem, não pretendo continuar falando sobre o som da Stela, gostoso mesmo é ouvi-la! Mas antes gostaria de dizer mais uma coisinha. Mustang é o nome de um bar daqui de Recife que fica no centro da cidade (atualmente mais com cara de pizzaria). Mas na época a imagem que ficou para Stela era de um bar frequentado por boêmios, solitários, gente com pouco dinheiro no bolso. Ao contrário do que se possa imaginar não se trata de uma homenagem a Recife, como nas próprias palavras de Stela: "é mais um cenário para comportar personagens que poderiam sair de qualquer cidade grande".

De todo modo, cara Stela, nós, recifenses, nos sentimos homenageados/as.

Seguem dois vídeos: Laura te espera com uma arma na mão e em seguida Mustang Bar.









Quem quiser ouvir o disco inteiro (vale demais!) pode acessar o site da gravadora Trama, clique aqui