quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

adoro esta valsa pop erótico-amorosa ;)


No Fundo
(Arnaldo Antunes /  Edgard Scandurra)

em cima de cima assim e acima
sobre do alto e de alto a baixo debaixo
ao lado atrás e de lado a lado detrás e
sob acolá e além de ali depois pelo
centro entre de fora dentro na frente
e já de agora em frente e daqui
defronte através e rente

no fundo no fundo no fundo no fundo

em pé de repente perto envolvido em
torno envolvendo em volta e de volta
já e também no meio na mosca no alvo
na hora fora daqui mas a poucos pés pouco
a pouco aos pés através atrás de viés
e em e ainda mais e ainda agora e a
cada vez de uma vez ainda

no fundo no fundo no fundo no fundo

ante e antes de então e então durante
e enquanto aqui por enquanto adiante
avante acerca e portanto ao largo ao
redor e lá e nos arredores nos cantos
cá de passagem logo tangente longe
distante hoje de ontem onde depois de
onde pra onde onde

no mundo no mundo no mundo no mundo


quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Conto de Natal

por Marcelo Carota (Pirata Z)

N um conto de natal
     ecco! - ou, 'Don' Angelo e o cavalo do Zorro

1973. eu, 7 anos de idade.
    como todo mundo, em toda família, eu tinha um tio meio 'torto' - casado com 
uma irmã de meu avô siciliano - e meio banana,  também. seu nome era [ó só]
Américo... rico. muito rico. bobo. muito bobo. vai vendo.
    todo ano, próximo ao natal, ele perguntava qual presente a gente gostaria de
ganhar, mas, no almoço de natal, sem nem embrulhar, ele dava pra todos uma
mesma revistinha do rato mickey... no ano seguinte, a mesma pergunta, e eu,
bobo, na batata, respondia: "a capa, a espada, a máscara e o cavalo do Zorro!". tá.
chegava o natal, revistinha do rato mickey. no ano seguinte, mesma pergunta,
mas, desta vez, pensando que, talvez por conta do cavalo, que devia custar uma
nota, é que eu nunca ganhava o que pedia, tirei o bicho do pedido. em vão... no
almoço de natal, revistinha do rato mickey... vendo-me murchar, 'DonAngelo,
meu avô,  não se conteve. cuspiu no prato uma castanha que estava comendo,
juntou os polegares às pontas de cada mão em concha e, agitando-as, disparou:
    - ascuta me, Américo: sei pazzo?
    - what's up? - provocou o tio américo, que adorava falar inglês menos para se
exibir e mais para irritar meu avô, sabendo-lhe o apego às suas raízes.
    - uatis api mio cazzo! risponda me: sei pazzo?
    - no, i don't. why?
    - então, caspita ! qual o prazer de deixar uma criança triste?!
    - mas eu não dei o presente?
    - ah, fancullo! um aviso: nunca mais - mai, capice? - dê presente para meus
netos, capice?
    - mas...
    - capice, pezzo di merda?
    - tá, tá, entendi...
    - ecco!
    e, com seu sangue siciliano ebulindo nas veias, 'Don' Angelo esmagou uma
noz com as bases das mãos, 'sinalizando', claro, que é o que faria com o crânio
do cunhado cretino, não fosse isso matar Giulia, a sua irmã, de desgosto, com
o que, além de tudo,  sem o bolo de nozes que esta fazia, os natais nunca mais
seriam iguais - e natal, para o meu avô, era coisa muito séria; daí sua fúria.
    'Don' Angelo foi um homem de amores plurais; assim, amou intensamente,
enquanto viveu,  os netos e as mulheres - nesta ordem,  graças à qual minha
avó, 'Dona Pina', assim o definia: - "um péssimo marido, um pai severo e um avô
de conto de fadas" - e foi, mesmo, tudo isso, mas eu tive a sorte de ser neto...
    militar reformado, nunca foi rico, mas,  para os netos - e para as "ragazzas",
claro - jamais negou nada, nunca aparecendo para ambos com as mãos vazias
[e, no natal, essa característica era elevada à enésima potência].
    pelos netos, em dezembro, sossegava o "periquito", vivendo exclusivamente
para a família. ia ao banco, sacava todo dinheiro duma conta de poupança que
mantinha para o natal, na qual,  de janeiro a novembro de cada ano, 'pingava'
toda grana que conseguia economizar. pegava o seu Maverick - que, pra mim,
nanico como fui em criança,  parecia um iate -,  juntava os netos,  e íamos às 
compras - exceto as de nossos presentes, que essa era uma delícia toda dele.
   
    filho de um comerciante de frutas, secos e molhados,
 'Don' Angelo era um craque pra escolher as melhores e
 mais variadas frutas. pelo toque e pelo cheiro, sabia se
 eram, ou não, as mais deliciosas - idem para a escolha
 das azeitonas e do azeite [siciliano, sempre, e o cheiro
 deste nunca mais saiu de minha memória], bem como
 do cordeirinho a ser assado e do vinho a ser bebido [até
 pelas crianças, aos bocadinhos por ele, claro, servidos].
    comprávamos ainda todos os ingredientes para as massas e doces que Dona
Pina preparava em casa - até os 9 anos, nunca comi massa industrializada -, e
mais: velas, adereços para a árvore que ele montaria, tudo de necessário para
receber "os cavaleiros e a princesa de meu reino", referindo-se, respectivamente,
aos 4 netos e à única neta de sua corte muito particular - e tudo isso em troca,
acredite, de ouvir uma única e mesma palavra de cada neto à sua pergunta:
    - então: tutti bellissimo?
    - ecco! - exclamávamos, individualmente, a palavra mágica.
    e 'Don' Angelo,  depois de ouvir 5 ecco, com o seu rosto de homem mais feliz
do mundo, ensopava um dos finos lenços que adorava ganhar. italianíssimo...
    por aí, creio, dá para imaginar o que significou pra ele a babaquice do tal tio
Américo, à qual reagiu não só esmagando a noz, mas, faltou dizer, chamando-
me junto a si, colocando-me no seu colo e, com o maior sorriso, dizendo-me:
    - ei, piccolo Zorro, que cara é esta, hãn? no natal do ano que vem, EU vou te
dar a tua capa, a tua máscara, a tua espada, e mais: vou te dar o teu cavalo!
    - branco, vô?
    - ecco!
    - grande?
    - bem - e olhou em direção ao Américo, antes de responder: - mezzo. pode?
    - ecco!
    - ecco! - repetiu 'Don' Angelo, com um sorriso diferente no rosto.
    durante o ano, eu não pensava noutra coisa que não no cavalo que meu avô
me prometera. em outubro, comecei a ser preparado para a chegada do bicho -
e meu avô, com toda sua lábia, me convenceu de que ter um cavalo 'diferente'
era muito mais legal do que ter um cavalo igual a qualquer outro. concordei.
    num domingo, estava na casa de meu avô.  Palmeiras e São Paulo jogariam
uma partida decisiva,  e meu avô estava muito agitado,  nervoso. acendeu seu
cachimbo, colocou-me em seu colo, e me perguntou:
    - quem vai ganhar, Zorro?
    - o Palestra. de quanto, vô?
    - não importa. basta ganhar - e viva o Palestra!
    - viva!
    5 minutos de jogo, gol do São Paulo. o cachimbo de 'Don' Angelo foi ao chão.
toca o telefone, minha avó atende e passa o aparelho pro meu avô, dizendo:
    - é o Américo.
    o tio Américo era tão são-paulino, mas tão são-paulino, que, rico, comprara
uma mansão no Morumbi, para facilitar a vida dos amigos que tinha no clube,
nos dias em que fazia festas pra estes.
    meu avô, já esperando a gozação, atendeu.
    - alô. sim... sei... caspita! já disse que sei! fancullo! o jogo apenas começou -
bum! bateu o telefone, e exclamou: - e viva o Palestra!
    - viva! - acompanhei.
    10 minutos para acabar o primeiro tempo. falta a favor do São Paulo. Pedro
Rocha, se não me falha a memória, vai bater. tem, dizem, um canhão no pé.
    - vô, eu quero um canhão pra colocar no pé.
    - filho, fica quietinho. vamos torcer pra bola acertar o placar.
    - mas cê me dá um canhão pra colocar no pé?
    - dou, mas depois.
    gol do São Paulo. desta vez, eu - não o cachimbo -, é que vou ao chão, com o
salto que meu avô deu da cadeira, berrando palavrões, brigando com o locutor,
esquecendo-se de que eu estava em seu colo...
    - desculpe, filho. foi sem querer que o vovô fez isso, ouviu?
    - ouvi. me dá um canhão pra colocar no pé?
    - dou, mas amanhã. hoje é dia de torcer pro Palestra. e viva o Palestra!
    - viva!
    toca o telefone.
    - se for o filho da puta do Américo, diz que tô com a irmã dele, ligo depois.
    - alô - atendeu 'Dona' Pina, que foi logo dizendo: - Américo, se eu fosse você,
ligava mais tarde.
    - certo, Pina, mas fala pro Angelo não se esquecer do que...
    - Américo - interrompeu minha avó.
    - quê?
    - fancullo!
    começa o segundo tempo. 15 minutos de jogo, pênalti para o Palmeiras, que
Leivinha converte. toca o interfone, minha avó atende.
    - sim, claro. mil desculpas. obrigado. - diz 'Dona' Pina, que desliga o aparelho
e fala para meu avô: - o síndico pediu pra fazer menos barulho.
    - corintiano filho de uma puta, isso sim!
    mais 10 minutos, Ademir da Guia cruza para César Maluco, que, de cabeça,
empata para o Palmeiras. indescritível,  a reação de meu avô. toca o telefone -
desta vez, ele mesmo atende:
    - parla, cornuto! grita agora, fala agora! o quê? da onde? sim, e daí? fancullo!
    - quem era, o Américo? - quis saber minha vó.
    - não, o síndico do prédio vizinho.
    - e o que ele queria?
    - pediu pra eu fazer menos barulho, o corintiano filho de uma puta.
    São Paulo, preferindo levar a decisão pros pênaltis, se fecha na defesa, e o
jogo fica amarrado, mas o Palmeiras insiste em tentar resolver o jogo no tempo
regulamentar. Luís Pereira vem com a bola lá de trás,  da defesa palmeirense,
avança rumo ao meio-de-campo,  e, quando um são-paulino vem marcá-lo, ele
toca para Dudu, que toca de primeira pra Leivinha, que dribla um, dribla outro,
avança e toca pra Ademir da Guia,  que conduz a bola até a meia-lua com toda
a classe que lhe valeu o apelido de "Divino", corta um, desvia de um 'carrinho'
e, antes que 'Don' Angelo terminasse de mastigar o braço da poltrona, toca na
bola por baixo, esta encobre o goleiro e desce "lambendo" a rede, e o Palmeiras
vira o jogo. 3 a 2. faltando 1 minuto pra acabar, a torcida invade o campo. fim.
    sentiram falta de algo e de alguém? eu também, no dia, porque 'Don' Angelo
não comemorou o gol, a vitória, o título, nada... saíra de mansinho da sala, pra
falar no outro telefone. ao encontrá-lo, vi que falava baixinho com alguém.
   
    - era o tio Américo?
    - não, filho, era a vizinha japonesa.
    - e o que ela queria?
    - não sei, filho, eu não falo japonês...
    noite de natal. 'Don' Angelo,  animadíssimo,  entregando os presentes para
os netos. chega a minha vez.
    - e a mio piccolo Zorro... questo!
    qual prometera, 'Don' Angelo me deu a capa, a máscara e a espada do Zorro.
    - e o cavalo, vô? - cobrei
    - amanhã, na casa da tia Giulia.
    mal dormi, aquela noite. já de manhã, as horas pareciam não passar, nada
de chegar a hora do almoço. me distraí com os apetrechos do Zorro, e usei um
cabo de vassoura à guisa de cavalo, e 'cavalguei' e enfrentei inimigos até ser
finalmente chamado para o banho, que tava na hora de ir à casa de tia Giulia.
    fui vestido de Zorro, como recomendara 'Don' Angelo, para minha alegria, e,
lá chegando, tio Américo, com os seus cabelos brancos levantados de um jeito
muito engraçado, parecendo um moicano, ou parecendo ter uma crina, pegou-
me no colo, colocou-me sobre os seus ombros, e me disse:
    - muito prazer, Zorro! meu nome é Pangaré, e eu sou o seu cavalo. Vamos?
    e tio Américo saiu correndo pelo jardim enorme de sua casa, trotando e, eu
não entendi porque, gritando "Palestra, Palestra, Palestraaa!!", mas me diverti,
achando até melhor que um cavalo de verdade, que não gritaria "Palestra"...
    eu o cavalguei por uns 5 minutos, até que meu avô veio, me tirou do ombro
de tio Américo, e disse:
    - pronto, filho. depois você anda mais a cavalo.
    - mas, vô, tava legal...
    - dopo, filho, dopo. eu prometo. eu sou de não cumprir o que prometo?
    - não.
    - ecco! e você, Américo, vá se arrumar, vá.
    - mas...
    - caspita! vá se arrumar, que seus netos chegaram, porca miséria!
    - olha, depois não venha me dizer que eu não paguei a...
    - Américo,  vá se arrumar pra receber seus netos! que prazer você tem em
deixar crianças tristes, dio santo!
    na hora, fiquei injuriado, mas 'Don' Angelo, esperto, me distraiu rapidinho,
retomando aquela conversa sobre comprar um canhão para o pé, e aí, claro, o
"cavalo" não importava mais.
    tempo depois, já crescidinho, ele já morto - 1982 -, é que pude, finalmente,
entender a dimensão emocional de 'Don' Angelo, "péssimo marido, pai severo e
um avô de conto de fadas". era mesmo. inclusive para netos que não os seus.
   
    ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ pz ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~



Marcelo Carota é jornalista, escritor, zineiro, paulista e palmeirense. 
Mora em Brasília/DF e se auto-denomina um caipira punk.

Texto editado originalmente em 19/12/2007 na Pirata Zine (zine eletrônica), edição 107, ano 4.








Boas  festas e um ano novo com muito humor, saúde e alegrias pra tod@s!


sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

trans.bordado


    eu vi
    a borda da lua                                                                                                                  
                             tran
                                    sbo 
                                         rda 
                                           ndo))
                                                 ((f
                                                  i))
                                                  ((o
                                                  s))
                                                   ((e o céu desabotoado
                                                      anoi
                                                      tecendo
                                                                 bordado

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

sábado, 8 de dezembro de 2012

museu de cera

ser é tudo que poderia 
ser plenitude
é tudo que é tudo
quietude 

zen

ser é tudo recém
sino pequenino 
de belém

ser é tudo 
que será mudo

no mundo
cera é tudo
que resta

:p

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

azul


há um blues tocando ao sul
de um azul da cor de seus anseios

há um sol tocando o céu

de seus gestos tão calejados

há um gesto quase macio 

no meio dessa encruzilhada

há um blues no seu olhar

um azul no céu, um sol ao sul

há um azul, turquesa e terno

na inquietação dos lábios

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

um cheiro


sinto falta de odores
talvez um jarro de flores
em minha mesinha, anulasse essa ausência

gosto de cheiro que carrega lembranças
mas me intriga não lembrar o teu...
preciso te cheirar mais um pouco
inventar um perfume carregado de ti
de nós, de nossa alcova

enquanto isso, leio Anna Akhmátova  
e contento-me (há dois dias)
com esse cheirinho de livro novo

sábado, 1 de dezembro de 2012

lembrando nós dois


hoje você bem que podia
me chamar pra sair, pra trepar
eu bem que podia
hoje amanhã depois
te roubar um beijo
te chamar pra sair
me exibir nua no espelho, trepar

você dizendo que eu me transformo
noutro ser quando dou meu lado b
você sem grana mas fazendo questão
de pagar o motel
(tão bobo esse seu lado machista)

hoje a gente bem que podia
mas você já voltou pra São Paulo
e eu te falei que vou torcer pra tudo dar certo

só não esqueça que a minha saudade lateja e molha, tá?